A Polícia Federal (PF) revelou a identidade de dois militares envolvidos na redação de uma carta redigida por oficiais da ativa, pressionando o comandante do Exército, General Marco Antônio Freire Gomes, a adotar uma postura radical frente aos apelos por um golpe para manter Jair Bolsonaro (PL) na Presidência em 2022.
A descoberta dos militares responsáveis foi possível por meio da análise de metadados do documento, recebido pelo tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, em 28 de novembro de 2022, um dia antes da publicação do texto.
O autor da carta foi identificado como o coronel Giovani Pasini, enquanto Alexandre Bitencourt, identificado como o coronel Alexandre Castilho Bitencourt da Silva, foi apontado como a última pessoa a realizar modificações no documento, conforme informações da Folha de S.Paulo.
Essas informações estão presentes no relatório da PF que fundamentou os pedidos de prisão e buscas em 8 de fevereiro, dirigidos a ex-ministros e militares suspeitos de conspirar para um golpe de Estado, com o objetivo de manter o ex-capitão no poder após a derrota para Lula.
Pasini, oficial de artilharia formado em 1997 pela Aman (Academia Militar das Agulhas Negras), afastou-se do caminho tradicional da artilharia para se dedicar ao ensino da língua portuguesa, tornando-se professor em colégios militares e autor de livros.
Em 2022, solicitou licença do Exército para concorrer a deputado estadual no Rio Grande do Sul pelo Patriota, mas não foi eleito. Após a divulgação da carta, retornou à reserva em fevereiro de 2023.
Alexandre Bitencourt, também formado em 1997 na arma de infantaria, recebeu a medalha militar de ouro com passador de ouro em fevereiro de 2023, em reconhecimento aos seus 30 anos de bons serviços. Em 2022, viveu no Chile por seis meses para realizar uma pós-graduação em condução de políticas estratégicas de defesa, retornando ao Brasil para assumir uma posição no Departamento-Geral de Pessoal.
A carta
A carta redigida por oficiais superiores da ativa quando bolsonaristas radicais acamparam por quase um mês diante de quartéis do Exército, solicitando intervenção das Forças Armadas contra a eleição de Lula.
Nesse contexto, a Polícia Federal revela que, simultaneamente, Bolsonaro e seus aliados discutiam estratégias para um golpe de Estado. As pressões de bolsonaristas e militares visavam instigar o comando do Exército a adotar uma postura golpista, com ataques nas redes sociais direcionados a generais contrários à ruptura democrática.
“Consideramos importante, portanto, que os Poderes e Instituições da União assumam os seus papéis constitucionais previstos em lei e em prol da pacificação política, econômica e social, especialmente para a manutenção da Garantia da Lei e da Ordem e da preservação dos poderes constitucionais, respeitando o pacto federativo previsto na regra basilar de fundação da República”, dizia trecho da carta dos oficiais.
O texto ainda afirmava que os militares estão “sempre prontos para cumprir suas missões constitucionais” e que os soldados “colocam os objetivos nacionais sempre em primeiro plano, desprezando quaisquer interesses pessoais”.
“Covardia, injustiça e fraqueza são os atributos mais abominados para um Soldado. Nossa nação, aquela que entrega os maiores índices de confiança às Forças Armadas, sabe que seus militares não a abandonarão.”
A carta, que circulou anonimamente, não revelou o autor, e o método de coleta de assinaturas impediu a contagem oficial de oficiais da ativa que subscreveram o documento.
A participação em manifestações conjuntas é considerada infração no Exército, sujeita a punições. A divulgação da carta foi uma resposta dos militares após oficiais da reserva publicarem uma carta aberta expressando desconfiança nos resultados das eleições.
“É natural e justificável que o povo brasileiro esteja se sentindo indefeso, intimidado, de mãos atadas e busque nas FFAA [Forças Armadas], os ‘reais guardiões’ de nossa Constituição, o amparo para suas preocupações e solução para suas angústias”, diz trecho.
O texto ainda pede que os comandantes apoiassem ações para o “imediato restabelecimento da lei e da ordem, preservando qualquer cidadão brasileiro a liberdade individual de expressar ideias e opiniões”.
Vale destacar que militares são proibidos por leis e regulamentos de se manifestar coletivamente, seja sobre atos de superiores ou em caráter reivindicatório ou político. À época da circulação da carta entre oficiais, o Alto Comando do Exército alertou sobre possíveis consequências para aqueles que aderissem ao manifesto.
“Srs bom dia Alertem aos seus subordinados que a adesão a esse tipo de iniciativa é inconcebível. Eventuais adesões de militares da ativa serão tratadas, no âmbito do CMS (Comando Militar do Sul), na forma da lei, sem contemporizações”, escreveu o general Fernando Soares para chefes de organizações militares.
Com informações da PF , Folha e do DCM